No Festival de Cannes de 2009, muita gente não entendeu a proposta do filme e até pediram explicação para ele, mas ele se negou, falou que era o melhor diretor de cinema e que fez o filme para ele depois de um período de depressão que enfrentou.
O filme já entrou para a lista dos 10 filmes mais controversos do cinema.
Para entender o filme, é necessário saber três coisas: a biografia de Lars, a Bíblia e Nietzsche.
Lars é um dos maiores cineastas da atualidade, assisti e gostei de vários, tais como: Os idiotas, Dançando no Escuro, Dogville, Manderlay e agora o Anticristo. Ele é um fundadores do manifesto de cinema Dogma 95. Entrou em depressão recentemente. Seus pais eram ateus, mas com o tempo ele ternou-se cristão e depois virou ateu de novo. Gosta muito do livro Anticristo de Nietzsche.
O filme é divido em prólogo, epílogo e os capítulos (Sofrimento/luto, O caos reina, Desespero/ feminicídio, Os 3 mendigos: Dor, Desespero, Sofrimento).
A primeira parte do filme mostra que enquanto os pais têm relação sexual, o filho pequeno se joga da janela, poderia ser interpretado como a queda da inocência. Há também a culpa da mãe por descuidar do filho para sentir prazer.
A mãe entra em estado de choque e vai se tratar com remédios, o pai é psicanalista e decide cuidar dela.
Durante o tratamento, ele cria uma lista de coisas que ela tem medo, ela diz que tem medo do Eden (onde tinha uma casa de campo que eles costumavam ir), mas Eden na Bíblia foi o lugar onde habitou Adão e Eva (Paraíso ou Jardim das Delícias).
Fala do filme: Tudo que costumava ser bonito em Éden talvez fosse horrível. Agora ouço o que não ouvia, o choro de tudo o que vai morrer.
A natureza é a igreja de Satã.
A natureza citada aqui, talvez não seja a natureza em si (florestas, animais, etc), mas a natureza humana, falaremos disso mais para frente.
Para vencer os medos o casal vai para o Éden, ela se recupera de alguns traumas e ele tem sonhos estranhos.
Ele: Mas tive alguns sonhos estranhos.
Ela: Sonhos não são interessantes para a psicologia moderna. Freud está morto, não está?
No capítulo 3: Desespero / feminicídio
É muito interessante esse capítulo, talvez seja uma denúncia ao feminicidio que ocorre ainda hoje na África (veja a cena da mutilação do clitóris), na Ásia e na América Latina ( principalmente no México), o diretor menciona as mortes das muheres no séc. XVI que foram acusadas de bruxaria. Nietzche escreveu:
A mulher foi o segundo erro de Deus. – “A mulher, por natureza, é uma serpente: Eva” – todo padre sabe disso; “da mulher vem todo o mal do mundo” – todo padre sabe disso também. Logo, igualmente cabe a ela a culpa pela ciência... Foi devido à mulher que o homem provou da árvore do conhecimento.
Como se proteger contra a ciência? Por longo tempo esse foi o problema capital. Resposta: expulsando o homem do paraíso! A felicidade e a ociosidade evocam o pensar – e todos pensamentos são maus pensamentos! – O homem não deve pensar.
Bíblia (Gênesis 3:6,7,13)
E viu a mulher que aquela árvore era boa para se comer, e agradável aos olhos, e árvore desejável para dar entendimento; tomou do seu fruto, e comeu, e deu também a seu marido, e ele comeu com ela.
Então foram abertos os olhos de ambos, e conheceram que estavam nus; e coseram folhas de figueira, e fizeram para si aventais.
(Deus) E à mulher disse: Multiplicarei grandemente a tua dor, e a tua conceição; com dor darás à luz filhos; e o teu desejo será para o teu marido, e ele te dominará.
Falas do filme durante o exercício da natureza:
Ele: Sou a natureza de todos os seres humanos.
Ela: Este tipo de natureza.O tipo de natureza que faz as pessoas causarem mal às mulheres.
Ele: Exatamente quem eu sou.
Ela: Esta natureza me interessou quando estive aqui. Era o assunto da minha tese. Mas não deveria subestimar Éden.
Ele: O que Éden faz?
Ela: Descobri mais do que imaginava.
Ele: Se a natureza humana é maldosa, também é válido para a natureza das mulheres?
Ela: Natureza feminina. Natureza de todas as irmãs. As mulheres não controlam seu corpo. A natureza é que controla.
Ele: Sou a natureza de todos os seres humanos.
O material que usou na sua pesquisa era sobre maldades cometidas contra mulheres, mas entendeu como a maldade das mulheres?
Ela: Sabe quantas mulheres inocentes foram mortas no século 16 só por serem mulheres? Tenho certeza que sabe.
Ele: Muitas.
Ela: Não porque eram más.
Ele: Eu sei.
Outra coisa que faz alusão à bíblia era a deformidade no pé do garoto e o ferimento que ela faz no marido.
Na bíblia Deus amaldiçoa a mulher e diz: E porei inimizade entre ti (a serpente) e a mulher, e entre a tua semente e a sua semente; esta te ferirá a cabeça, e tu lhe ferirás o calcanhar.
Traduzindo: a descendência da mulher mataria a descendência da serpente com golpes na cabeça enquanto a descendência da serpente feriria o calcanhar da descendência da mulher.
Aí Nietzche falou que a mulher e a serpente é a mesma coisa (“A mulher, por natureza, é uma serpente: Eva” – todo padre sabe disso; “da mulher vem todo o mal do mundo”).
Pelos motivos bíblicos a mulher leva toda a culpa e todos os pecados do mundo, ela se anula em relação ao prazer, ao gerar ela tem o poder sobre vida (deixar nascer) ou da morte (abortar), ela trouxe o conhecimento para o mundo (ciência) e Deus os expulsou do paraíso, por isso ela acha a natureza obra de Satã. Talvez a mulher seja o Anticristo.
Uma parte do filme é quando mostra o casal tendo relação sexual embaixo de uma árvore, traduzi literalmente como o comer do fruto, ela sempre conduz o marido a comer do fruto (fazer sexo), independente do sofrimento que a aflige.
Ninguém disse o que vou dizer: Achei esse filme feminista, mostra o terror em ser mulher ao longo da história, faz denúncia do feminicídio que estão diante dos nossos olhos, da culpa em sentir o prazer e ser mãe.
muito bom seu estudo sobre o filme, estou com muita vontade e muito medo de ver esse filme, adoro Lars Von Trier, mas tenho um pouco de aversão a alguns conceitos, ainda muito obscuros para mim, da Bíblia... Fiquei com mais vontade de ver! Será que consigo ler a biografia dele, a bíblia e reler o Anticristo antes!? Acho que isso de querer entender tudo direitinho desde o começo é coisa de sagitarianos não é!? rsrs
ResponderExcluirbjo ;***
Oi, Yu; Eu gosto mais da filmografia que a biografia do Lars, dizem q ele é uma pessoa difícil de lidar, ainda é depressivo. Os filmes dele são sempre cruéis e perturbadores. A bíblia é o livro mais difícil do mundo, eu fiz um ano e meio de teologia para depois lê-la inteira e entender mais ou menos, mas é o livro que se vc nao entende vc nao consegue decifrar filmes, livros e até artes plásticas. Até p/ ler Nietzche tem que entender as acusações que ele faz do cristianismo citando a bíblia.
ResponderExcluirOi Ana,
ResponderExcluirgostei dos comentários sobre o filme, salvo alguns pontos passíveis de correção: na transcrição do diálogo, vc coloca algumas falas trocadas, como por exemplo quando ela pergunta se ele sabe quantas mulheres foram mortas no séc. 16(...)Quem fala isso é Ele. E no desfecho, ela diz ''eu sei, é que às vezes eu esqueço''.
Eu concordo com sua conclusão sobre o filme, que de certo modo é feminista, e creio que a premissa básica do filme é a ''Santa'' Inquisição da igreja católica (no final, ele até bota ela na fogueira...).Uma amiga minha me disse que na década de 90 o Lars descobriu que o pai dele não era o pai biológico, e que ele ficou meio doido com isso, pq, segundo minha amiga, a mãe que revelou isso antes de morrer, fazendo-o entrar numa grave crise. Não encontrei nada a respeito disso, mas se for verdade, acho que é muito importante para a compreensão do filme, explicar um pouco da concepção dele sobre a natureza feminina, que é tão abordada/atacada no filme.
Que bom encontrar alguém com o mesmo ponto de vista... o filme é forte e por mais que pareça uma agressão a mulher, a idéia é totalmente controversa... entende quem quer e como quiser... pra ser mulher é preciso ter coragem, principalmente no tipo de cultura que a nossa geração escolheu viver.
ResponderExcluirInfelizmente uma grande maioria vê a mulher como simples objeto sexual, o pior de tudo, é que elas estão quase acreditando que só pra isso mesmo que elas servem...
Olá pessoal,
ResponderExcluirQue bom que encontrei pessoas que tentam explicar esse filme, muito doido por sinal, mas concordo que foi feito para entender como quiser. Também concordo que tem a ver com os sentimentos da mulher em relação ao sexo. Ela estava desenvolvendo uma tese sobre o feminicidio e o assunto a acabou perturbando, fazendo com que ela assumisse a condição de natureza má da mulher imposta pela igreja do século XVI e praticando rituais de bruxaria contra o marido e o filho. O marido, contagiado pela confusão, queimou a própria esposa! Abraço
Eu adoro esse filme, assim como todos os outros do Lars Von Trier... Ele é um artista genial, visionário, perturbador e revelador! De fato, ele é muito mal compreendido, mas no mundo de hoje, onde a cultura é rasa, fica difícil ver um filme como esse sem se indignar... É preciso muita referência cultural pra entender "Anticristo", e também possuir a mente aberta pra se envolver com uma narrativa tão dolorosa e às vezes enojante: eu mesma não consegui olhar algumas cenas... Mas a beleza estética, musical e poética do filme superam qualquer obstáculo e o cinema triunfa! Aliás, a cena inicial, em câmera lenta, de sexo ao som de uma ária de Handel, é uma das mais lindas que já vi no cinema... "Anticristo" é um filme esplêndido!
ResponderExcluirAndei muito ocupado, mas finalmente conseguir ver esse filme completo, só ele e eu.
ResponderExcluirSempre que vejo obras como essa, eu sempre estudo sobre, me aprofundo o máximo que posso.
Assim que terminei de ver (quase agora), procurei estudá-lo e tenho que dizer que sua teoria sobre o filme é realmente fascinante!
Eu pensei do mesmo jeito que você, mas não relacionei diretamente com a religião, porque primeiro queria ver o lado psicológico da arte.
Mas assumo que você me ajudou bastante a espandir o que eu achava.
Muito bom mesmo, parabéns!
A parte do exercício da natureza você transcreveu errado. Re-assista e preste atenção. Você trocou os papeis. Na verdade, seria mais como:
ResponderExcluirEle: Sabe quantas mulheres inocentes foram mortas no século 16 só por serem mulheres? Tenho certeza que sabe.
Ela: Muitas.
Ele: Não porque eram más.
Ela: Eu sei. É que às vezes eu me esqueço.
obrigada pela observaçao, Leonardo. Escrevi às pressas e acabei trocando as falas. Nem vou trocar o texto, visto que seu comentário já corrigiu a informaçao.
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