domingo, 1 de agosto de 2010

Eu, ela e minha alma

 "A alma localiza-se em uma pequena glândula no centro do cérebro".
[René Descartes - Paixões da alma, 1649]

"A alma é a sua própria fonte de descobertas". [Heráclito]

Eu, ela e minha alma (Tráfico de almas) ou o nome original, Cold Souls é um filme americano de ficção científica, sobre um ator, Paul Giamatti (é o nome do personagem e o nome real do ator que interpreta)  está ensaiando a peça Tio Vânia, do Tchecov, tio Vânia é um homem muito perturbado, na casa dos 40, mas que não suporta a vida. O ator começa a sentir as mesmas aflições do personagem a ponto de não conseguir lidar com isso. Seu agente avisa-o sobre uma clínica que você pode depositar sua alma por algum tempo.
O ator deposita sua alma no cofre, sua alma materializada parece um grão-de-bico, ele perde seus sentimentos, o ensaio da peça ficou algo bem mecânico, até porque atores não podem deixar de ser sensíveis. Ele vai a um jantar com a esposa e alguns amigos, uma colega menciona que alguém da família está doente, ligado aos aparelhos e ele, insensível, falou: Por quê não desligam os aparelhos? Todos ficaram pasmos. Ele estava sentindo um vazio e voltou à clínica para reaver sua alma, mas existe uma máfia russa que faz tráfico de almas e uma "mula", mulher responsável por trazer a alma da Rússia para os EUA, rouba a alma do ator para emprestar a mulher do mafioso que é uma loura-burra, aspirante à atriz, mas sem nenhum talento. Como ele ficou sem alma, ele pede emprestado a alma de um poeta russo (que na verdade é de uma poetisa, mas os russos doam as almas anonimamente, elas são identificadas pelas profissões que a pessoa exercia, não por gênero). Engraçado foi durante uma conversa da máfica russa que eles estavam pensando em traficar almas do EUA para Rússia e um deles fala: Mas quem na Rússia quer alma de americano? Eu ri.
O filme é muito bom, às vezes dramático, com umas pitadas de humor, misturados com a peça de Tchecov.
 Refletindo sobre alma: Dizem que a alma é eterna, onde habita a vida, os sentidos, é o nosso lado não palpável, do latim anima, do grego psiquê, há explicações psicológicas, religiosas, mas nada que explica muito bem como lidar com ela.
Ah, se eu pudesse depositar minha alma durante uns dias em algum lugar (desde que nenhum traficante roubasse!), tem dias que a gente precisa ser frio e calculista para resolver algum pepino, ser forte quando alguém da família está doente, fingir que está tudo bem quando termina um relacionamento, se nessas situações perdêssemos a alma, não ia doer tanto. Como diz Carlos Drummond de Andrade:
Tenho apenas duas mãos
e o sentimento do mundo

Fernando Pessoa também diz:
Não sou nada
Não serei nada
Não posso querer ser nada
À parte disso, tenho em mim todos os sonhos do mundo


Também tenho todos sentimentos do mundo: amor, piedade, fraternidade, desejos, sonhos, ódio, egoísmo, impaciência, culpa, mágoa, desejos de vingança ou de perdão.  Alguns sentimentos são bons, outros são doloridos, às vezes os bons quando acabam se tornam maus, é nessa hora que eu quero perder a alma ou não, se acaso aparecer um colo quientinho, uma mão que me afague e um lábio bom que me beije, talvez eu me aquiete e perceba que vale a pena manter a alma em seu lugar.
O mal do século são as doenças da alma: o medo, a solidão, a depressão, síndrome do pânico. Queremos gritar S.O.S (save our souls), mas ninguém escuta, eles só buscam a cura do corpo, mas a dor da alma é infinitamente mais intensa, não há remedio que cure, não há ferida que cicatrize.

Por que estás abatida, ó minha alma, e por que te perturbas em mim? [Salmos 42:5]

2 comentários:

  1. muito boa a resenha, fiquei morrendo de vontade de ver! é novo? Nunca ouvi falar!

    Beijo!

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  2. Não sei se entrou no circuito, ele é do ano passado e foi apresentado na Mostra.

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