domingo, 8 de outubro de 2017

Hannah Arendt - Eichmann em Jerusalém - Parte 2

Ja falei da parte 1, "A corte" aqui.

O acusado


Adolf Eichmann nasceu em 1906, em Solingen, uma cidadezinha alemã. Na escola foi um aluno bem mediocre e não chegou a terminar o ensino médio.

Trabalhou como vendedor nas empresas Vacuum Oil Company e na Elektrobau Company, localizadas na Austria. Porém, era um empregado mediocre e foi demitido das duas.
Estava noivo de Veronika, com quem se casou e so o fez porque casados nao eram demitidos facilmente dos empregos e a taxa desemprego era altissima.

Entrou para o Partido, nao por ideologia, mas como muito alemaes, para sobreviver e conseguir trabalho. Nao teve tempo de se informar sobre o partido, cujo programa nem sequer conhecia e nem leu Mein Kampf.

Arendt observou o jeito que Eichmann se exprimia na corte, utilizando apenas frases feitas, clichês e linguagem burocratica. Segundo ela: "Quando mais escutava-o, mais era evidente que sua incapacidade de falar estava estritamente relacionada com sua incapacidade de pensar"

Ele nunca gostou dos empregos que teve, era um homem frustrado. Quando entrou na Sicherheitsdienst (SD) - serviço de espionagem, ignorava completamente a real natureza do lugar e foi uma decepçao. Também nao podia prever os proximos eventos.

Sua primeira tarefa na SD foi de arquivar informaçoes sobre a maçonaria. Na logica nazista maçon, judeu, catolico e comunista eram tudo farinha do mesmo saco. Ele também colaborou na formaçao do museu da maçonaria. Os nazistas criavam museus para perpetuar a memoria dos inimigos. Depois foi transferido para o departamento que cuidaria dos assuntos judaicos.

Para esclarecer sobre a burocracia, orgaos, departamentos e onde Eichmann trabalhava exatamente:

A SD (Sicherheitsdienst ) era um orgao subordinado à SS (Schutzstaffel) - esquadrao de proteçao, grupo paramilitar e policial nazista. Em seguida, a SD e a Gestapo (Geheime Staatspolizei) - policia secreta do Estado - passam a ser subordinadas à RSHA (Reichssicherheitshauptamt) - Escritorio central de segurança do Reich - que era dividida em 7 seçoes e inumeras subseçoes. O Eichmann trabalhava na Seçao IV (combate aos inimigos do Estado), subseçao B (seitas), sub-subseçao 4 (judeus).
Resumindo: ele trabalhava na seçao IV-B4 da RSHA que se ocupava do destino dos judeus e onde ele foi promovido a Obersturmbannführer, uma espécie de tenente-coronel, mas na realidade nao passava de um mero chefe da sub-subseçao de um departamento burocrata.

O terceiro capitulo é intitulado "Especialista em assuntos judaicos", pois foi esse o titulo que ele recebeu sem saber nada sobre a historia dos judeus. Eichmann, a pedido de seu chefe, leu a obra classica "Der Judenstaat" (O Estado Judaico), de Theodor Herzl, o pai do sionismo (movimento politico e religioso nascido pela nostalgia de Siao, ou seja, tinham o desejo de ter uma patria, pois os judeus viviam espalhados pelo mundo). Também leu "Historia do Sionismo", de Adolf Böhm e sempre confundia um livro com o outro. Ele achou a ideia sionista interessante e passou a fazer tudo o que estava ao seu alcance para a deportaçao dos judeus.

Primeira soluçao: expulsao

  • Imigraçao ilegal para Palestina 
  • Projeto Madagascar: Evacuaçao de 4 milhoes de judeus da Europa para esta ilha que estava sob o dominio francês, na costa da Africa e que ja tinha mais de 4 milhoes de pessoas da populaçao nativa. Nao tinha transporte suficiente para levar toda essa gente, pois as fronteiras estavam fechadas por causa da guerra, o mar era controlado pelos ingleses e a ilha controlada pelos franceses.


Segunda soluçao: concentraçao
Em 1939, o regime nazista tornou-se ainda mais totalitario e criminoso

  • Campos de concentraçao
  • Campos de exterminio


Soluçao final: exterminio
Estado Judenrein (sem judeus)

Segundo Arendt, Eichmann foi levado pelas circunstâncias, nao sabia exatamente o que estava fazendo e nem imaginava o tao complexo e perigoso o regime tornaria com o passar dos anos. Porém, ele cumpria as ordens e obedecia sem questionar seus superiores, como todo burocrata.
Ele nao era um monstro que queriam transforma-lo, era um homem comum, menosprezado por seus colegas e chefe, inofensivo, rejeitava a violência em seu cotidiano e era muito eficiente nas tarefas em que estava encarregado de cumprir. Segundo a autora, ele vivia em um Estado Criminal e desobedecer as ordens era um delito e violaçao da norma estatal, passivel de graves consequencias.
Ela questiona os meios usados por Israel para sequestra-lo na Argentina e condena-lo impondo a pena de morte.
O condenado junto com a defesa declararam que ele foi usado como bode expiatorio, pois estava pagando nao pelos crimes que cometeu, mas pelos crimes do regime em que fazia parte, ele era apenas um alemao representando todos o que serviram o regime. Ele nao era inocente, pois era de uma certa forma cumplice de forma indireta do que aconteceu e trabalhava no setor responsavel pela evacuaçao e deportaçao dos judeus. Embora ele tenha dito que nunca matou ninguém ativamente, indiretamente ele organizou as saidas dos trens para os campos de concentraçao.

A autora também expoe os paises que foram coniventes, inclusive enviaram judeus, comunistas, ciganos, intelectuais, entre outros para esses campos. Fala das igrejas protestantes e catolicas, incluindo o vaticano que nem sequer manisfestaram, so depois do fim do regime que algumas emitiram nota de perdao pela omissao. (Eita corja que dança conforme a musica!)

Ela também menciona os crimes barbaros cometidos pelos paises vencedores da guerra e que nunca foram a julgamento.

É um livro muito interessante para refletir sobre justiça, acusaçao, crimes de guerra,  direito internacional, responsabilidades, submissao, obediência cega, a transformaçao de crimes graves em algo banal e cotidiano, etc.


Recomendo outros livros que falam de processo e condenaçao de pessoas:


  • "Eu acuso!", de Émile Zola. É uma carta aberta ao Presidente Félix Faure, publicada no jornal "L'Aurore", em 1898, em que ele defende o capitao Alfred Dreyfus, um judeu que estava sendo acusado injustamente de vender informaçoes confidenciais para Alemanha. Além de denunciar toda a corrupçao do sistema politico e judiciario, Zola acusa-os de antissemitas.
  • "O ultimo dia de um condenado", de Victor Hugo. Um homem foi condenado e sera guilhotinado, nos leitores nao sabemos que crime ele cometeu. Ja falei do livro aqui
  • "O Processo", de Franz Kafka. Joseph K. esta em seu lar, a policia invade, confisca seus bens e leva-o preso. Ele nao sabe porque foi preso, pois nao cometeu crime nenhum e ninguém sabe informa-lo. Mostra um sistema altamente burocratico, cheio de regras, ninguém entende aquela bagunça, nem os leitores. 
  • "O Estrangeiro", de Albert Camus. Meursault é o cara mais apatico do mundo, nao tem um pingo de sentimento por ninguém e nem remorso ou arrependimento pelo homicidio sem motivo que cometeu. A corte passa a julga-lo mais por seu comportamento, sua indiferença e sua personalidade fria que pelo crime.
Veja também: 

Nenhum comentário:

Postar um comentário