terça-feira, 9 de outubro de 2018

O Calibã e a Bruxa, de Silvia Federici


Este livro é uma pesquisa sobre a condiçao das mulheres na "transiçao" do feudalismo para o capitalismo. Repensa a analise da acumulaçao primitiva de "O Capital", vol.1, de Karl Marx e também "A Teoria do Corpo", de Michel Foucault, sob o ponto de vista feminino.
O titulo vem de dois personagens da peça shakesperiana "A Tempestade": O Calibã representa o rebelde anticolonial, simbolo do proletariado, especificamente o corpo do proletariado como terreno e instrumento de resistência da logica capitalista.
In The Tempest the conspiracy ends ignominiously, with the European proletarians demonstrating to be nothing better than petty thieves and drunkards, and with Caliban begging forgiveness from his colonial master.
A Bruxa (Sycorax, mae de Calibã) é a concretizaçao de um mundo de assuntos femininos que o capitalismo tinha que destruir: a herética, a curandeira, a esposa desobediente, as mulheres que queriam morar sozinhas, etc.

"Whereas Marx examines primitive accumulation from the viewpoint of the waged male proletariat and the development of commodity production, I examine it from the viewpoint of the changes it introduced in the social position of women and the production of labor-power. Thus, my description of primitive accumulation includes a set of historical phenomena that are absent in Marx, and yet have been extremely important for capitalist accumulation. They include  the development of a new sexual division of labor subjugating women's labor and women's reproductive function to the reproduction of the work-force; the construction of a new patriarchal order, based upon the exclusion of women from waged work and their subordination to men; the mechanization of the proletarian body and its transformation, in the case of women, into a machine for the production of new workers. Most important, I have placed at the center of my analysis of primitive accumulation the witch-hunts of the 16th and 17th centuries, arguing that the persecution of the witches, in Europe as in the New World, was as important as colonization and the expropriation of the European peasantry from its land were for the development of capitalism".
I should add that Marx could never have presumed that capitalism paves the way to human liberation had he looked at its history from the viewpoint of women. For this history shows that, even when men achieved a certain degree of formal freedom, women were always treated as socially inferior beings and were exploited in ways similar to slavery. “Women," then, in the context of this volume, signifies not just a hidden history that needs to be made visible; but a particular form of exploitation and, therefore, a unique perspective from which to reconsider the history of capitalist relations.
A caça às bruxas, sob um regime patriarcal opressor, foi uma guerra contra as mulheres para denegri-las, demoniza-las, domestica-las e destruir seu poder social, visava também destruir o controle que as mulheres exerciam sobre seu corpo, sua sexualidade e sua funçao reprodutiva. A mulher foi confinada no lar, sem direito a um salario. Mesmo as que trabalhavam, o salario ia para os maridos. Elas perderam toda autonomia, principalmente financeira, foram retiradas dos espaços publicos, proibidas de terem acesso à educaçao, à vida politica e religiosa, foram confinadas apenas para a reproduçao, as ricas para gerarem herdeiros e as pobres para gerarem mao-de-obra barata. Elas ficaram dependentes do homem para tudo
The separation of production from reproduction created a class of proletarian women who were as dispossessed as men but, unlike their male relatives, in a society that was becoming increasingly monetarized, had almost no access to wages, thus being forced into a condition of chronic poverty, economic dependence, and invisibility as workers.
O poder da Igreja no argumento de autoridade, como ja citei aqui, que em nome de deus cometeu muitas atrocidades, combatendo todo tipo de cultura e religiao que eram diferentes do "cristianismo". As mulheres que nao se adequavam ao modelo imposto eram acusadas de bruxas, assim como os movimentos hereticos e do milenarismo (resistência anti-feudal do XII e XIII sécs).
A igreja através da santa inquisiçao que se auto-intitulou como a justiça de deus na terra, cometeu o maior feminicidio da historia da humanidade, participou ativamente da colonizaçao e converteu à força, por meios da violência, tortura e mortes, indios e escravos. Além do feminicidio, foi conivente também com o massacre de 2/3 dos nativos da América e a escravidao dos africanos e nativos.
Para o avanço capitalista, toda forma de comunalismo tinha que ser destruida, como os anabatistas que seguiam os passos dos primeiros cristaos de dividirem tudo entre eles em partes iguais, ou os indigenas ou tribos africanas que faziam o mesmo. O comunalismo deu lugar ao individualismo.
A igreja também politiza a sexualidade e regula o comportamento sexual:
The Church attempted to impose a true sexual catechism, minutely prescribing the positions permitted during intercourse (actually only one was allowed), the days on which sex could be practiced, with whom it was permissible, and with whom forbidden.
O casamento torna-se um sacramento no séc. XII, nenhum poder na terra pode dissolver o matrimonio. A igreja intensifica o ataque à sodomia.
No catolicismo as mulheres nao eram ninguém, enquanto nas seitas heréticas elas administravam sacramentos, pregavam, batizavam e dividiam o teto com um homem sem casar.
As beguines, era um grupo de mulheres que moravam juntas, longe do controle dos homens e das regras monasticas, um exemplo de mulheres livres que existiu.
Nos séculos XIV e XV o estupro é descriminalizado, se uma mulher é solteira, viuva, doméstica ou esta sozinha  na rua, o homem se vê no direito de estupra-la e nada acontece judicialmente, pois ela que esta errada em nao ter um homem ou de ter que andar sozinha. Uma vez estuprada, perde a dignidade, nao vai arrumar um casamento e so resta a prostituiçao. Começa entao o culto à virgindade, à castidade, à pureza, etc. Dai surge o argumento de mulher para casar e mulher para se divertir.
Durante a colonizaçao, a primeira geraçao de mestiços nascida na América foi concebida através do estupro de mullheres nativas e escravas africanas.
Ha a institucionalizaçao da prostituiçao, abertura de bordeis municipais com o aval da igreja que justifica que estes lugares sao necessarios para evitar a sodomia e a orgia dos hereges. Veja a diferença que a sexualidade do homem nao sofre nenhuma alteraçao, ele tem permissao para estuprar, visitar prostitutas e casar com uma mulher casta, enquanto as mulheres sao proibidas de qualquer forma de prazer, a esposa faz sexo pra procriaçao e a prostituta como meio de sobrevivência, ambas sob o dominio do patriarcado que decidem o que fazer com o corpo delas.
Foi proibido o uso de plantas contraceptivas, a parteira foi substituida pelo médico homem, a gestaçao e o nascimento passam a ser controlados pelo estado.

Cartesianismo: O corpo como maquina ou a disciplina do corpo

Descartes e Hobbes. Filosofia mecânica, o corpo é comparado a uma maquina com intuito de maximizar sua utilidade no trabalho, a maquina tornou-se modelo do novo comportamento social.
Descartes and Hobbes express two different projects with respect to corporeal reality. In Descartes, the reduction of the body to mechanical matter allows for the development of mechanisms of self-management that make the body the subject of the will.
In Hobbes, by contrast, the mechanization of the body justifies the total submission of the individual to the power of the state. In both, however, the outcome is a redefinition of bodily attributes that makes the body, ideally, at least, suited for the regularity and automatism demanded by the capitalist work-discipline.
Foucault demonstrou que a mecanizaçao do corpo envolve a repressao dos desejos, emoçoes ou outras formas de comportamentos que deveriam ser erradicadas. O produto desta alienaçao do corpo é o desenvolvimento da identidade individual, o conflito da mente e do corpo (alter ego) representa o nascimento do individual na sociedade capitalista, moldado pela disciplina laboral.

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